O Brasil vive um momento importante para o futuro da bioeconomia e dos serviços ambientais. No dia 6 de junho de 2025, o Governo Federal abriu a consulta pública para a regulamentação da Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (PNPSA), instituída pela Lei nº 14.119/2021.
Essa regulamentação definirá as regras para quem poderá ser remunerado por serviços ambientais e como isso será feito. Embora o decreto proposto pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) traga avanços, ele também apresenta lacunas que podem afetar diretamente os produtores rurais.
Neste artigo, mostramos os riscos e as propostas de melhoria elaboradas pela Jiantan , startup paranaense que atua remunerando produtores rurais pela remoção de carbono em vegetação nativa.
Por que a regulamentação do PSA é decisiva para o produtor rural?
O Brasil possui aproximadamente 545 milhões de hectares de vegetação nativa, cobrindo 65% do território nacional (MapBiomas, 2022). Desse total, 41,3% está dentro de propriedades rurais privadas, o que consolida os produtores rurais como grandes responsáveis pela conservação ambiental do país.
Além de proteger os recursos naturais, essas áreas desempenham funções vitais, como regulação climática, conservação da biodiversidade, proteção de nascentes e remoção de carbono da atmosfera.
É por isso que o pagamento por serviços ambientais (PSA) é uma ferramenta essencial para valorizar quem já protege e incentivar novos investimentos em conservação.

Quais são os riscos detectados pela Jiantan?
A análise técnica da Jiantan identificou três pontos críticos no texto do decreto, que podem comprometer a segurança jurídica e a efetividade ambiental da política.
1️⃣ APPs e Reservas Legais fora do PSA
O texto do decreto não reconhece APPs e Reservas Legais como áreas elegíveis para pagamento por serviço ambiental, diferentemente do que diz o Art. 41 da Lei 12.651/2012, o Art. 9 da Lei 14.119/2021.
Da firma como está, o decreto conflita com a legislação existente e exclui da política de pagamento por serviço ambiental grande parte das áreas responsáveis pela conservação ambiental em propriedades rurais privadas.
2️⃣ Conflito entre o Cadastro de PSA e o Registro de Carbono
O decreto propõe a criação de um Cadastro Nacional de PSA em conflito, no caso de remoção de carbono, com o Registro Central do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE), regulamentado pela Lei 15.042/2024.
Isso pode gerar sobreposição de cadastros e burocracia para os produtores interessados em acessar os dois mercados.
3️⃣ Mistura inadequada da remoção de carbono
A proposta federal inclui genericamente “captura e retenção de carbono” entre os serviços ambientais. O problema é que a remoção de carbono (CDR) já possui metodologias reconhecidas e mercados estabelecidos, inclusive com lei federal disciplinando sua conversão em crédito de carbono. Misturá-la com serviços ainda não quantificáveis, como proteção de fauna, flora ou mananciais, só aumenta a insegurança e o risco de sobreposição de instrumentos.
Como o mercado de carbono já possui regras, metodologias e legislação própria, isso aumenta a insegurança jurídica.
A Jiantan propõe que a remoção de carbono seja tratada separadamente, respeitando o mercado regulado já existente.

As propostas da Jiantan para aprimorar o decreto
Com base nesses riscos, a Jiantan propõe:
✅ Incluir texto descritivo de APPs e Reservas Legais como áreas elegíveis ao PSA.
✅ Segmentar a remoção de carbono dos demais serviços ambientais no decreto.
✅ Integrar o Cadastro Nacional de PSA ao SBCE, evitando conflitos.
A mobilização da CNA, OCB e outros órgãos representativos de produtores rurais em nível nacional é necessária pois o Pagamento por Serviço Ambiental PSA é uma política pública inovadora, mas se descolada da realidade do campo e da legislação ambiental brasileira, corre o risco de não entregar os resultados socioambientais e econômicos a quem tem parte considerável de seu patrimônio investido em preservação ambiental: o produtor rural.
O Brasil tem 65% de seu território coberto por mata nativa (MapBiomas, 2025) e apresenta uma legislação ambiental robusta e moderna e uma estrutura fundiária em que 99% das propriedades rurais tem menos de 1.000 hectares (IBGE, 2017) o Brasil pode se tornar um líder ambiental global, mas para isto precisa construir do fortalecimento de regras que:
1. Reconheçam e remunerem os produtores rurais pelos serviços ambientais prestados em suas áreas de preservação permanente e reserva legal;
2. Ausência de conflito em leis e regulações federais;
3. Segmentação entre mercado de carbono e outros serviços ambientais ainda não precificados e quantificados segundo critérios internacionalmente aceitos.
Pontos críticos para o fortalecimento do PSA no Brasil
Proposta do Decreto Federal – No Art. 6° os incisos VI e VII mencionam captura e retenção de carbono por boas práticas agrícolas e o inciso VIII se refere à possibilidade de pagamento por serviço ambiental apenas para a manutenção das áreas cobertas por vegetação nativa que seriam passíveis de autorização de supressão para uso alternativo do solo.
Conflito do Art. 6° com legislação existente – O texto não cita áreas de preservação permanente (APP) e reservas legais (RL) como provedoras de serviço ambiental. A elegibilidade para recebimento de pagamento por serviço ambiental das áreas de preservação permanente e reserva legal está prevista no Art. 41 da Lei 12.651/2012 (Novo Código Florestal Brasileiro e no Art. 9 da le1 14.119/2021 (Política de Pagamento por Serviço Ambiental). Além disto, a aptidão para geração de crédito de carbono das áreas de preservação permanente e de reserva legal é amparada pelo Art. 46 da lei 15.042/2024.
Proposta do Decreto Federal – Art. 9° O Comitê Gestor do Programa Federal de Pagamento por Serviços Ambientais – CGPSA, órgão colegiado de natureza consultiva e deliberativa possui as seguintes atribuições:
Conflito do 9° com legislação existente – Conflito com o Órgão Gestor do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões previsto na Lei 15.042/2024.
Proposta do Decreto Federal – Art. 10°. O CGPSA, respeitada a paridade entre o poder público, a sociedade civil e o setor produtivo, terá a seguinte composição:
Conflito do Art 10° com legislação existente – Conflito com o Art. 9 da lei 15.042/2025 que trata do Comitê Técnico Consultivo Permanente.
Proposta do Decreto Federal – Art. 19º. O Cadastro Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais – CNPSA será mantido e gerido pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima.
Conflito do Art. 19° com legislação existente – Conflito com Art. 23 e Art. 24 da lei 15.042/24 que trata Registro Central do SBCE.
Proposta do Decreto Federal – Art. 20º. O Cadastro conterá, no mínimo, as seguintes informações dos planos, projetos e programas de PSA:
I – a localização das áreas objeto do contrato e os respectivos serviços ambientais prestados;
II – as metodologias e os dados que fundamentaram o cálculo dos pagamentos por serviços ambientais realizados; e
III – os contratos de Pagamento por Serviços Ambientais.
Conflito do Art. 20° com legislação existente – Conflito com § 5º do Art 6º da lei 14.119/2021 que determina que o contrato de pagamento por serviços ambientais pode ocorrer por termo de adesão, na forma de regulamento. O contrato por adesão oferece transparência, agilidade de adesão ou desistência e redução de custos.
Consulta pública aberta até 20/07
O prazo para contribuições vai até 20 de julho de 2025. Produtores, sindicatos, cooperativas e associações podem participar diretamente e garantir que a política valorize quem de fato preserva.
O Brasil tem a chance de liderar globalmente a agenda de serviços ambientais. Mas isso só será possível com uma política coerente, tecnicamente segura e construída com quem protege.
Produtores rurais precisam ocupar esse espaço e defender suas áreas de preservação, segurança jurídica e oportunidades de receita.
É hora de mobilizar associações, cooperativas, federações e produtores para enviar sugestões e garantir que o PSA brasileiro tenha coerência técnica, segurança jurídica e efetividade ambiental.
Quem protege, precisa ser ouvido.
📥 Para enviar suas contribuições, acesse o link da consulta pública.
Fontes: MapBiomas (2022) IBGE (2017) Lei nº 14.119/2021 Lei nº 15.042/2024